Hoje no metrô tive uma demonstração gritante do que é a exclusão digital no que Alexandre Soares Silva chama de “esse Brasilzão de meu Deus”. Entrei no trem e notei que alguém falava em voz alta e pastosa. Olhei ao redor e logo encontrei a fonte do discurso: um homem sujo, de cara encardida, raça indefinível. Usava um gorro ensebado, várias camadas de camisas, e uma calça jeans curta que deixava à mostra a perna de outra calça, essa social, provavelmente usada à guisa de cueca. Olhando o jornal do vizinho, comentava:
— Olha lá, olha lá! Dez milhões! Feladaputa… Eu com dez milhões fazia a festa, rapaz. Fazia mesmo. Vixe.
Os passageiros riam. O senhor sentado ao lado do eloqüente maltrapilho ria mais que todos, um riso condescendente. Animado pelo apoio velado do público, o sujeito continuou:
— Mas não preciso de nada disso não. Não preciso. Eu só preciso é da minha fé em Deus. Gosto muito de Deus, muito mesmo. Eu não gosto é do Diabo.
Mais risos. Seu vizinho de assento acenou em aprovação.
— Não gosto mesmo! Chamei o Diabo pra porrada e ele não veio, o cuzão. Arrombado… Se eu morrer, vou pegar o Diabo de porrada no inferno. Feladaputa…
O senhor ao lado arriscou um comentário:
— É isso aí!
E ele:
— Eu não tenho nada na vida. Durmo na rua, não tenho cama, nem colchão, nem cobertor. Minha cama é o asfalto. Às vezes durmo no metrô mesmo. Olha isso — mostrando a canela. — Olha a feridona. O cara lá diz que é câncer. Câncer é o caralho!
Desconforto entre os passageiros.
— Quem tem câncer é o meu pai. O velho. Câncer nas costas. Toooooodo fodido, o velho. É foda.
O senhor ao lado fez outro aceno, esse de compreensão da dor alheia.
— Mas eu não tenho câncer nenhum. Que câncer nada! Eu tenho é piolho. Rapaz, os feladaputa dos piolho quase me come vivo. Eu mato tudo, toco fogo na roupa, mas não adianta: os bicho volta tudo depois.
O vizinho tratou de procurar outro lugar para se sentar.
— Bicho desgraçado… Piolho comigo é na unha, rapaz!
Silêncio no vagão.
— Sou soldado, sabia? Fuzileiro da Segunda Região Militar, Barueri. Bom de tiro. Vai mexer com meu pai pra ver se não leva tiro. Vai mexer com a minha mãe, vai. Dou tiro, arranco a cabeça fora. Não mexe com meu pai! Não mexe! Tá vendo esse vidrinho aqui? — tirou o vidrinho de um envelope — Nitroglicerina!
Silêncio tenso.
— Nitroglicerina! Se eu jogo essa porra no chão, já era. Hehehe. É nada, brincadeira. É perfume, ó. Ó, tô passando. Eita perfume ruim da porra!
Nesse momento, entrou um moço numa cadeira de rodas. A cadeira era empurrada por uma moça gordinha.
— Ô, rapaz. Sua cadeira é automática?
— Né não.
— É… Parafusada?
— Não.
— Pô, sua cadeira não é porra nenhuma! Sua mulher?
— É sim.
— Bonita, bonita… Têm filhos?
— Não.
— GRAÇAS A DEUS!
Gargalhadas de alívio entre os passageiros. Levantando-se, o mendigo agradeceu a atenção de todos e desembarcou.
Mas por que eu falei em exclusão digital lá no começo do post? Oras! Imaginem esse mendigo com um computador conectado à Internet. Suas declarações sem relação uma com a outra eram posts prontos. Seria melhor que a maior parte dos blogueiros que se vê por aí.
Uma vítima da exclusão digital
E aí vem ela me dizer que tem a exclusividade das pessoas bizarras no metrô. Ilusão.
Deve ter sido muito engraçado a parte do vidrinho de perfume. hehehe.
P.S.: acho que você empolgou ao publicar, o post saiu 2 vezes. 😉
Ora!
Tenho que parar de beber! Estou vendo quatro posts iguais!
Pq diabos o post tá em dobro? Deu pau no servidor?
Tava com saudade dos posts do profeta, estou recomendando este site para várias pessoas. linkei no meu email e mandei pra geral (para todos)!
É isso aí, pedala Robinho!
Ele tinha algum pompom?
Esse post tá muito bom. Adoro gente insana e bizarra. Vai ver que por isso eu venho sempre aqui.
Qto ao mendigo ser melhor que muitos blogueiros, discordo. Tudo depende da razão da existência de seu blog. Cada um escreve o que quer, mesmo que o texto seja uma porcaria.
Bjs
Ola mizifi suncê esta certo existem por ai muitos blogs que só enchem linguiça (da mais barata do tipo frita infla fura espirra banha) e mesmo em seus delirios e paranóias o “bom” mendigo tinha alegria vida e poesia em sua vida mesmo alheio a tragédia uma grande amostra que é possivel ser feliz com infimas coisas que Deus abençoe este mendigo..deixo minha bença…eparre mizifio
“Pode não haver loucura em sua razão,mas a muita razão em sua loucura”
se eu morrer, é que foi phoda…
Só na minha cidade não tem metro, saco, numca nos divertimos…
Mendigos, a alegria do mundo está toda reservada na insanidade desses seres. É inegável que eles são divertidos. Pior são os “neo mendigos.” Nesta terça, estava voltando para casa quando vi um homem deitado no chão, duas esquinas de minha rua. Ao lado, sua mãe mandando ele levantar, que ele só dava vergonha, aquele sermão adolescente. Problema que o homem em questão passou dos 40 e mora justamente na minha rua, com a mãe. Alcolizado, preferiu deitar no chão do que tentar chegar em casa. Chamaram os vizinhos para carregar o rapaz, um vexame para a mãe em questão. Assaz divertido…
A pior exclusão não é a digital, talvez seja a social, decorrente de muitos párias que metem a mão no dinheiro.
Ou pensando melhor, seja a psicológica, acreditando em messias e diabos, em um universo de alguns bilhões de anos-luz…Como ele, o mendigo, também acredito apenas em Deus, criador do Universo, e é óbvio, em algumas pessoas sensatas.
Disse a madre Teresa : Os pobres sofrem mais com a rejeição das pessoas do que com a falta de bens materiais. Se nós não os rejeitássemos eles não seriam pobres. A solidão e o sentimento de ser indesejável é a mais terrível das misérias.
Genial!
Que você não me ame, tudo bem, mas me esculhambar em público é foda. 😛
realmente seria um perigo esse cara escrevendo…
odeio adimitir, mas acho que ele seria melhor do q eu
Temos que tomar cuidado, este cara é uma arma. Ele não mentiu quando disse que tinha nitroglicerina nas mãos.
Essas figuras que de vez em quando animam o nosso trajeto de rotina. De vez em quando é bom ouvir suas histórias. Certamente, se tivesse blog seria um dos mais visitados… Dô valor à pessoa criativa!
Será que só eu me senti ofendido?…
Felizmente tem figuras como você pra ver essas coisas e contar pra gente… Nem precisamos do blog do mendigo, ainda que eu não duvide que alguns por aí devem ter um.
Esse mundo não faz sentido.
Taí, vou começar a prestar mais atenção no que os mendigos dizem.
É uma escola, realmente.
Realmente seria muito bom, mas talvez ele não conseguisse contar dessa forma, o que torna a história interessante e engraçada. Muito bom mesmo.
Muito bom, muito bom. Ri alto, aqui. ;>)
Quando voce morrer, voce vai pro céu.
Só de sacanagem.
Marco, por favor, por obséquio, pelo amor de todos os deuses/alás/orixás que existirem, tire uma dúvida minha: é possível colocar no css de uma página alterações para a tag A, de forma que esses links abram em outra janela? Já tentei o target e não consegui, não quero ficar digitando “target=’_blanck'” a cada link colocado. Se tiver, tem como me ensinar?
Agradeço. Assim você ajuda a acabar com a exclusão digital minha.
Valeu
Que post bom, marcurélio!!
Adorei… ler coisas assim algram o meu dia!
hahahahaha
Abraços
os anjos falam pela boca dos desconhecidos.
essa frase deve ser de Paulo Coelho ou alguém que o valha.
mas tenho que dizer que a exclusão digital e social não é privilégio do Brasil não. essa exclusão da qual tanto nos orgulhamos é um problema sério, no mundo inteiro.
Mas será que ele tinha tomado uma?
🙂
É… Os mendigos sempre surpreendendo…
Há uns anos atrás, vi um mendigo e sua conjuge na rua de mãos dadas… Quando olhei pra cara dos dois, estavam de óculos escuros e mascando chicletes!
Meu irmão tem uma teoria. E que um dia prestei mais atenção e vi que ele tinha razão: todo mendigo tem um cachorro. Já reparou, ô, Chicoteia?
Acho que vou estudar essa relação mendigo-cão e ver o que descubro…
Estas coisas são muito divertidas…
Abração!
Opa!
Vc é o cara q escrevia “coisinhas piegas” num blog há alguns anos?
Se não for, desconsidere esse coment.
Se é vc:
Bom, achei seu blog velho no google quando digitei “Sonhos Sonhos São”! Gostei mto! Mto loko oq tu escreve!
E esse lance do mendigo foi fera, hahah! Adorei!
Responde no meu flog, OK?!
Falou, irmão!
Bacana esse post. Divertido.
Mas sobre o comentário da Priscila, de que todo mendigo tem um cão, existe outra teoria de que cada cão (as vezes matilha) tem um mendigo.
Deve ser um tipo de solidão canina, um sentimento de ser indesejável unindo cães e mendigos e os resgantando da mais terrível das misérias (se me permitem plagiar o Daniel e tb citar Madre Teresa).
Meu deus.. isso nao é um “mindingo” isso é um profeta.. e vc realmente acha q aquilo era perfume no vidrinho? era bygon.. isso sim.. desodorante bygon.. perfume bygon
devemos nos juntar e dar um pc pra esse filho de deus
[]s
Tenho certeza que há mais verdade nas palavras nessas palavras soltas pelo mundo afora do que nas minhas palavras meticulosamente digitadas! Tantas vidas, histórias e pessoas hão de passar por essa vida sem nenhum registro na web. Que bom. Vou desligar o computador e dar uma voltinha na minha rua!
alguem pode me dizer se aqui se tem coragem de denunciar empresas eclesiasticas com o unico proposito de depenar os otarios? renascer em cristo e IURD sao as mestres! pelo amor de Deus! tem alguem com coragem nessa…^%$%^#????
po, mas e o câncer do mendigo? coitado!
ótemo! ri bastante…. oh, pessoas que temos hj em dia…
Um veículo para ser depenado, primeiro precisa ser roubado.
Então, cada um que cuide do que tem.
E depois não há como proibir quem quer escolher seu caminho.
Lotéricas, igrejas, ou casamento, trabalho é ruim ? Depende.
Escolheu errado, só poderá receber o correspondente à sua escolha.
Hehehhehe. “Ótemo”, ótemo (copyright “Nah”)! Muito engraçado…
Escutou a “Narração de enterro” que te mandei?
Ele é melhor do que eu!