E lá se foram Moisés, Arão e deus, de volta à prancheta.
— E a-a-agora, Ja-Javé?
— E agora Javé?/A festa acabou,/a luz apagou,/o povo sumiu,/a noite esfriou,/e agora, Javé?
— Q-que po-porra é e-essa?
— É Drummond, seu ignorante. Aliás, esse “a luz apagou” me deu uma idéia. Porra, como eu não pensei nisso antes? Essa vai ser pra arrasar de vez com o Faraó e todo o Egito. Vou escurecer o país inteiro.
— E d-d-da-daí?
— Como, e daí? Daí que vai ficar tudo escuro, os caras vão ficar apavorados.
— Ah, J-Ja-Javé, cê j-já foi m-m-me-melhor…
— Porra, Moisés, cê não bota fé em mim, né? Eu vou mandar pro Egito uma escuridão tão espessa que luz nenhuma vai conseguir atravessar. Cê vai ver. Aliás, não vai ver. Levanta aí sua mão pro céu. Vai, anda. Levanta a mão.
Moisés levantou a mão, meio a contragosto, e na mesma hora as trevas se abateram sobre o Egito. As pessoas acendiam tochas, lamparinas, lampiões, lâmpadas, faróis, holofotes, mas luz nenhuma era capaz de vencer tamanha escuridão. Ninguém saía de casa. Ora, poucos tinham coragem de sair da cama!
Na terra de Gósen, é claro, tudo permaneceu normal. Depois de três dias de absoluto breu, Arão resolveu dar uma ligada para o Faraó.
— Alô?
— Faraó?
— Ele mesmo.
— Demorou pra atender, hein?
— Claro que demorei, porra! Pensa que é fácil achar o telefone nesse escuro? Arrebentei minha canela na quina de um móvel aqui, então não me irrite. Quem tá falando?
— Arão, Faraó.
— Arão, meu amigo! Há quanto tempo, rapaz! Tudo bem aí com você e Moisés?
— Er… Sim, Faraó, tudo beleza.
— Que bom, que bom, fico feliz! Acho que vocês ainda querem ir com o povo ao deserto, não?
— Sim senhor.
— Ok, então por que não vêm até aqui pra gente discutir os detalhes da viagem?
— Olha, a gente até queria ir. Mas não vai dar pra encarar essa escuridão toda não.
— Ora, então por que vocês não pedem pro Javé acender a luz, pra vocês poderem vir aqui conversar comigo…?
— Droga. Cê é esperto, né?
— Pra caralho. Mas venham, estou ansioso pra falar com vocês.
— Tá, vou ver aqui com o Moisés. Té mais.
— Tchau.
Moisés ligou para deus e explicou a situação. As trevas se dissiparam e os dois irmãos puderam ir ao palácio.
— Olá, meus amigos, como vão vocês? Preparados para a viagem?
— Sempre!
— Que bom, porque dessa vez é sério mesmo. Podem ir, todos vocês: homens, mulheres, velhos, crianças, todo mundo. Só peço que deixem os animais aqui.
— Ih, Faraó, não vai dar. A gente precisa levar os animais também, ordens de Javé.
— Porra! Eu aqui dando minha autorização pra vocês irem, abrindo uma exceção que jamais abriria, e vocês ainda me vêem com exigências? Pois querem saber? Do Egito vocês não saem! NUNCA!
— M-M-Mas, F-F-Fa-Faaaaaaa… Fa-Fa-Fi-Fo-Faaaaaaaaaaa… Fa-Fa-Fe-Fe-Fi-Fu-Faaaaaaaaaaa…
— PÁRA! Você me irrita, Moisés! Essa sua gagueira, essa sua teimosia, essa mania de achar que é líder dos hebreus! Puta que pariu, você me irrita! Suma da minha frente, mas suma de vez. Nunca mais quero te ver. Se te vir de novo, te mato, desgraçado!
— T-Tem r-ra-razão nu-numa c-coisa. V-você n-n-n-nunca mais v-vai me v-v-ver…
Pois é, ainda não foi dessa vez. Mas reparem que essa foi a nona praga, então só falta uma. Será que deus vai conseguir inventar uma praga tão cruel que convença o Faraó a deixar o povo de Israel ir embora? Parece difícil, mas a experiência nos mostra que nunca devemos subestimar a crueldade divina.