Estava Jacó um dia em sua tenda pensando no que fazer. A fome assolava a terra e a família começava a passar apertos. Olhou para fora, viu os filhos de papo pro ar e emputeceu-se.
— Que que cês tão aí de braços cruzados, bando de vagabundos? Ouvi dizer que no Egito tem comida a dar com o pau. Por que vocês não vão até lá para comprar mantimentos em vez de ficarem aí feito uns songo-mongos?
— Mas pai…
— Mas pai meu ovo! Vão logo, os dez. Só Benjamim fica aqui comigo, José morreu porque deixei vocês cuidarem dele, não vou fazer a mesma cagada com outro filho.
Benjamim, lembremo-nos, era o outro filho que Jacó tivera com Raquel, a esposa que amava, e ela morrera no parto. Como o velho dava José por morto, Benjamim passara a ser o filho predileto. Os outros? Ah, um bando de songo-mongos.
Ora, como já estamos carecas de saber (vocês não estão? Droga!), José era o responsável pela administração da venda de mantimentos no Egito. Imaginem agora a cena: Os dez filhos de Jacó vêm até José e se ajoelham perante ele, sem reconhecê-lo. Na hora José se lembrou do sonho. Estão lembrados do sonho? Não? Cazzo, eu tenho que relembrar tudo a vocês? Refresquem a memória aqui.
Pronto? Então vamos tocar em frente.
José, claro, reconheceu os irmãos, mas fingiu que não e falou com eles cheio daquela arrogância que só as bichas muito bichas sabem ter:
— Posso saber de onde é que estão vindo os donzelos?
— Viemos de Canaã, senhor para comprar mantimentos.
— Meu cu. Vocês são espiões, vieram para xeretar nossa vidinha aqui no Egito.
— Não, senhor! Nós, teus servos, somos irmãos e viemos comprar comida.
José a-do-rou o tratamento, mas continuou firme em cima do salto Luís XV:
— Mentira deslavada! Olha, um com mais cara de espião que o outro!
— Seu Safnat-Paneah, nada disso, por favor! Somos doze irmãos filhos de um homem de Canaã. O mais novo ficou com nosso pai e o outro já não existe mais.
— Ai, me poupem! Não são espiões? Então vão ter que provar. Um de vocês vai voltar a Canaã e trazer esse irmão mais novo de que falaram. Os outros vão ficar presos aqui até que o caçula venha. E se não vier, morrem todos.
Dito isso, mandou prender os irmãos até que decidisse qual dos dez voltaria para pegar Benjamim. Quê? Maldade? Maldade nada! Pior foi o que eles fizeram ao nosso pobre viadinho, vendendo-o como escravo. José tinha mais é que deixá-los um bom tempo na masmorra. Mas tinha um coração mole, tadinho, e depois de três dias foi falar com eles.
— Olha, vamos fazer o contrário: Um de vocês fica preso aqui e os outros nove vão buscar o irmão que falta, levando os mantimentos que comprarem. Tudo bem?
Esse “tudo bem?” foi, obviamente, uma pergunta retórica. Quem eram eles para questionarem uma decisão do governador do Egito?
— Tá vendo? — Disse um dos irmãos — Isso é castigo pelo que fizemos com José há vinte anos.
— Eu avisei — Respondeu Rúben —. Falei para vocês não fazerem mal ao menino. Mas vocês me ouviram? Nãaaaao. E agora temos que pagar. Ô, merda.
Começaram a discutir e jogar uns sobre os outros a culpa pelo que tinham feito ao irmão. Nem se importavam com a presençade José, pensavam que não estava entendendo lhufas, mesmo porque ele só falava com eles através de um intérprete. José saiu disfarçadamente da presença deles e chorou. Chorou muito, pobrezinho.
— Ai deus, ai deus! Que ironia cruel do destino! Ai, essa minha vida daria uma novela! Quem eu vou deixar preso agora? O melhor seria deixar o mais velho, mas Rúben foi o único que pelo menos tentou me ajudar. Ah, então vai ser o segundo filho. Ai, tadinho de papai, vai ficar tão sentido com isso tudo!
Depois de muito chorar, retocou a maquiagem e voltou ao cárcere para anunciar sua decisão. Mandou amarrar Simeão na frente dos outros, e ordenou aos servos que botassem o dinheiro dos irmãos de volta em suas sacolas de mantimentos, sem que eles (os irmãos, não os mantimentos) percebessem. Feito isso, os nove irmãos carregaram os jumentos e partiram de volta para Canaã. Nâo, não sairam carregando os jumentos. O que eu quis dizer é que eles pegaram as sacolas e… Bah! Vocês entenderam.