Esaú ficou muito puto da vida mesmo. Peludo e carrancudo daquele jeito, parecia um gorilão revoltado. E fez um plano: Isaque não ia viver muito. Depois que o velho morresse e se cumprissem os dias de luto, ele, Esaú, mataria seu irmão. Simples assim. Ah, e vocês pensando que eles iam só ficar sem se falar por um tempo…
Porém Rebeca, que podia ter todos os defeitos mas de besta não tinha nada, ficou sabendo desse plano de Esaú e chamou Jacó para avisá-lo.
— Escuta aqui, moleque: seu irmão quer se vingar de você, ele vai te matar por causa daquela presepada que você aprontou.
— Que eu aprontei?! Mas mãe, foi idéia sua, eu só…
— Cala a boca, não discute com a mamãe! Presta atenção: Você vai embora agora mesmo para a casa do meu irmão Labão.
— Lobão?
— LABÃO, Jacó! Ele mora em Harã, você sabe. Fica por lá um tempo, até seu irmão esquecer do que você fez com ele.
— Mas mãe, Harã é tão longe…
— Cê tá ousado hoje, hein, moleque? Obedece a mamãe que você ganha mais, se você me obedecesse sempre, não tinha caído nessa confusão, pra começo de conversa.
— Mas mãe, foi justamente porque eu te obedeci que o Esaú…
— Chega de “mas mãe” pra lá, “mas mãe” pra cá! Parece papagaio!
— Mas mãe, nem existe papagaio aqui!
— Tá querendo apanhar, Jacó?
— Não, mãe.
— Então cala a boca e presta atenção! Quando Esaú estiver mais calmo, eu mando te chamarem de volta.
— Mas mãe, o pai também deve estar puto com a gente, quer dizer, comigo, não vai me deixar ir.
— Disso eu cuido.
Depois desse diálogo cheio de amor e carinho com seu filho predileto, Rebeca foi falar com o marido.
— Isaque do céu, não agüento mais essas hetéias do Esaú. Vivem me infernizando, falam mal de mim, não gostam da minha comida, dizem que nossa tenda é uma bagunça, criticam minhas roupas. Se Jacó se casar com uma hetéia ou qualquer mulher dessas de Canaã, eu me mato!
Isaque, sabendo do temperamento da esposa, nem discutiu. Além do mais, imaginem o desgosto na vida desse homem: o pai ameaçara matá-lo, além de privá-lo da convivência do irmão mais velho, o filho mais novo era um velhaco vigarista sem-vergonha e o mais velho ameaçava tornar-se um fratricida. Mais por apatia do que convencido pelo argumento de Rebeca, chamou Jacó, o abençoou e disse:
— Jacó, não quero que você se case com um dessas mulheres aqui de Canaã. Pega suas coisas e vai para a Mesopotâmia, para a casa do seu avô Betuel e seu tio Labão, vê se consegue se casar com uma de suas primas. Que deus te abençoe, meu filho.
E Jacó mais que depressa se mandou para a Mesopotâmia, viagenzinha rápida, oitocentos quilômetros em lombo de camelo.
E vejam vocês como era o Esaú: vendo que o pai abençoara Jacó novamente, não ficou com raiva do velho. Seu negócio era com Jacó, e isso seria resolvido mais tarde. Ficou sabendo que Isaque não queria que Jacó se casasse com uma mulher de Canaã e compreendeu que o pai não via as cananéias com bons olhos. Então, foi até as terras de Ismael, seu tio paterno, e casou-se com Maalate, filha de Ismael. Esaú pretendia com isso apenas agradar ao pai, casando-se com uma prima, exatamente o que Isaque ordenara a Jacó.