Vacas calouras e uma lição do caçula

Post escrito originalmente para o maravilhoso blog Gente, foi horrível!

Estou prestes a completar 32 anos. Não sou nenhum jovenzinho, sei muito bem. Nem por isso, porém, vou aceitar desaforo. Pois vejam: semana passada estava eu feliz da vida encarando o trânsito da Radial Leste para chegar ao trabalho. Eis que paro num farol1 ali na Mooca e sou abordado por duas garotas de cara pintada. “Amazonas guerreiras!”, pensei eu, antes de perceber que eram apenas duas calouras da São Judas. Faziam parte de um grupo grande de calouros, que estavam ali tentando arrecadar uns trocados para os veteranos. Uma delas se debruçou na minha janela, expondo uma boa fatia dos peitos. Eu, mais que depressa, olhei para o outro lado.

Tá, talvez não tãaaaaaao depressa.

Ok, ok! Sequei os peitos da garota, tá bom? É um impulso mais forte do que eu, não consigo evitar. Enfim, a filhadaputa mostrou as muxibinhas e abriu a matraca:
— Tio, ajuda a gente, compra um pacote de balas. Só dois reais, tio!
O tal “pacote” era um saquinho com duas ou três balas dentro. Fiz que não com a cabeça. A outra, que trazia nas mãos um chumaço de cabelos, não perdeu a oportunidade:
— Então compra cabelo, tio. Cê tá precisando!
Vacas. Putas. Ornitorrincas adolescentes com suas vozes esganiçadas. Eu queria descer do carro e espancar as duas. Mas me controlei e disse:
— Vocês estão fazendo o quê?
— É trote, tio! Os veteranos obrigaram a gente a…
— EU SEI que é trote. Estou perguntando que porra de CURSO vocês estão fazendo na faculdade.
— Ah… Rádio e TV, tio!
— Pois então, Rádio e TV. Vocês vão passar o resto da vida na merda, sem dinheiro nem pra comer. É melhor irem se acostumando a ficar sem dinheiro, né?
— …
— Olha lá, o farol abriu. Com licença.
Parti satisfeito, mas não plenamente. Minha vontade mesmo era dizer: “Tio? Não sabia que meu irmão andava comendo tua mãe”. Merda de civilidade.
Por falar no meu irmão, não é que o moleque me ensinou algo muito importante e valioso dia desses? Pois foi! Ele me ensinou que não se deve exibir comportamento socialmente inaceitável, fiando-se no manto ilusório de anonimato oferecido pela multidão. Conto.
Semana passada. Estava caminhando pelo centro da cidade, comportando-me alegremente da forma mais inaceitável possível. Ninguém me conhecia, que se fodessem todos. Entrando na Praça Ramos de Azevedo, porém, levei um susto quando um sujeito de terno gritou:
— ÊÊÊ, DEDÃO NO NARIZ!
Era meu irmão, que estava voltando do almoço. Imaginem a minha cara.

1 Eu sou paulistano e falo “farol” mesmo. Não me interessa que nome o aparato tenha aí no seu exótico rincão.

22 comments

  1. detesto trote, detesto calouro e detesto, detesto ser chamada de tia por marmanjo. depois dos 15 a pessoa deveria ficar proibida de sair por aí chamando os outros de tio.

  2. No ano novo minha vizinha chegou lá em casa com um amigo dela de cadeira de rodas. O cara simplesmente começou a me char de gordão. Na primeira, na segunda, eu relevei. Mas depois comecei a chama-lo de aleijadinho e a fazer piadinhas horriveis com ele. Normalmente eu respeitaria, mas ele mesmo mostrou que não merecia ao chamar todo mundo por apelidinho s escrotos. Tem gente que nao se enxerga.. E os calouros são assim. Estão lá descabelados, todos meio sujos, pedindo esmola como mendigos e ainda se acham no direito de tirar uma da sua cara…

  3. não gosto dos dias de trote, me lembro como sou frustrada por não ter entrado em nenhuma faculdade ainda. é xarope tb qdo eles vem em bando cobertos de tinta, parecendo a volta dos mortos vivos pedindo trocados.

  4. “Ele me ensinou que não se deve exibir comportamento socialmente aceitável, fiando-se no manto ilusório de anonimato oferecido pela multidão.”
    “Gentil” senhor, no versículo retromencionado (desculpe a heresia) não seria o vocábulo correto: inaceitável, em vez de, aceitável?

  5. ninguem merece esses trotes, monte de adolescente querendo dinheiro para patrocinar orgias durante o fim de semana inteiro…e nem te convidam, se fosse comigo não teria sido tão gentil assim nao ;p

  6. Me lembro bem do meu primeiro trote: Tinha entrado na Faculdade de Quimica da USP. Até ai, grande merda… Depois de cinco anos de tormento, mudei de curso sem diploma nem orgulho (sim, às vezes acontece). Mas o que me choca é ver que agora estão esquematizando a porra do trote! Quando foi minha vez, não tinha essa historia de “Tio, compra balinha?”. Nos falavamos “Boa tarde! Tem alguma coisa para o bicho?” e aceitavamos tudo: balas, chicletes, numeros de telefone (às vezes acontecia!), cantadas e até dinheiro! Mas agora, o povo quer grana, grana, grana!!!! Atomanocu! (desculpa o plagio)
    Lembro-me de outro causo: três anos depois do meu bendito trote (nessa época ja estava amargurado e trabalhando, sem ir a uma aula sequer):um bicho me pediu algo para seu pedagio. A unica coisa que tinha no carro era o desodorante ambiental “Pinho Agreste”, que minha mãe insistia em comprar (ela sempre gostou de carro “cheiroso”, entenda-se “com o mesmo cheiro que um banheiro de hospital”). Não tive duvida: ele ganhou um frasco usado de pinho agreste! Essa era a grande graça do trote! Agora… TIO? Se alguém me falar nesse tom, eu passo por cima do pé!

  7. kkkkkkkkkk… a verdade nua e crua… como alguém em plena consciência faz curso de radio e tv? Alguma novidade sobre a festa??????????????

  8. Existe um degrau ainda mais degradante após esse de serem bixos. Tornam-se estagiários. Mas divago: devia ter respondido com o “Tio? Não sabia que…” mesmo, Marco! O máximo que eu já consegui de eloqüência ao ser chamado de “tio” foi: “Tio é a putaqueopariu!” Lastimável… ¬¬

  9. o meu trote foi foda… no melhor curso de todos!! o/
    se vcs fossem meus veteranos, provavelmente agora diriam “é memo??” ou “vai se fuder!” ou “é memo? então vai se fuder!”
    eu amo o que faço =D

  10. Po, Marco, sou quase-uma-radialista-pq-to-no-4-ano …
    Amo meu curso, vc nem comecou a ir pra uninove (pelo menos eu acho) e ja ta pagando de jornalista metido! tsc tsc tsc. [risos]
    falemos a verdd… o duro nao eh fazer RTV. Mas RTV na São Judas.
    Ficar sem dinheiro não vou mesmo. essa mania de desmerecer a profissao dos outros! que coisa… 🙁 Só nao digo que estou sentida, pq isso acontece comigo todo o dia, explicar o que eu faco pros leigos. bah…
    não, nao eh uma critica, adorei o post. Só nao falem mal de RTV…

  11. Esse foi o melhor post dos últimos anos. Quase mijei na cueca de tanto rir.
    Também não nutro grande simpatia por calouros… mas confesso que sou mais mole. Na última vez, duas garotas lindinhas vieram no meu carro pedir dinheiro. Eu perguntei pra quê, e ela responderam, com aquela voz melosa que só uma garota de 17 anos é capaz de fazer: “ah, pra festaaar, pra fazer churrasquiiiinho”.
    Não resisti. Tasquei tudo que eu tinha em moeda na mão dela. Sei lá, não gosto de calouros, mas o biquinho dela falando “churrasquinho” foi demais pro meu coração. Daria mais dinheiro, se tivesse…

  12. Segunda-feira vou pro meu trote. Se vocês acham RTV inútil saibam que passei em Ciências Sociais…Quem quiser me dar um trocadinho ou um desodorante ou uma meia furada, aceito tudo, dê uma passadinha no trote da USP, belê? E, pô, sociólogo já vive na merda, então já vai ser um treinamento pros dias vindouros…[vindouros foi uma bosta.]

  13. É, Marco, acho que você deveria tê-la questionado acerca do romance entre o seu irmão e a digníssima mãe da caloura.
    Sempre detestei trote, tanto que nem participei do meu (hehehe). Sempre detestei também esse negócio dos calouros ficarem pedindo grana por aí, sem dar nada em troca (entenda como preferir). Se ainda funcionasse no estilo barraca do beijo, só que podendo dar uns amassos bem legais ainda poderia ser. Mas assim, a seco? Nãããooo.
    Abraços a todos.

  14. ô gente fina, eu faço rádio e tv e pretendo não morrer de fome.
    e trotes como estes só podiam ter sido inventados por uma mente privilegiada. ainda bem que aqui em sergipe é cada um por si e o resto que se foda.
    graças aos deuses

Deixe uma resposta