Davi firma-se no poder

(II Samuel 3:1-21)
A trégua proposta por Abner não durou muito: Joabe começara a guerra, e não ia desistir dela tão fácil. A guerra foi se arrastanto, portanto, com o lado de Davi se fortalecendo cada vez mais, e o de Isbosete cada vez mais fraco. O negócio estava tão sossegado pro lado de Davi, na verdade, que ele até achou tempo para ter filhos durante os sete anos e meio que durou a guerra. Com suas esposas Ainoã e Abigail teve dois garotos de belos nomes, Amnon e Quileabe. Não contente em comer as esposas, porém, o rei de Judá resolveu conhecer uma tal Maacá, princesa de Gesur, e com ela teve um outro menino chamado Absalão; uma garota chamada Hagite, com quem teve Adonias; depois uma Abital, que lhe deu Sefatias. Por fim, Davi casou-se com uma certa Eglá, e os dois tiveram Itreão. Davi, como podemos ver, era bom de cama mas bem ruinzinho nesse negócio de escolher nomes para os filhos.
A natural superioridade do exército de Davi não foi, porém, o único fator a determinar seu fortalecimento político e seu sossego para procriar feito coelho. Pois aconteceu que Isbosete, o rei de Israel que na verdade era um fantoche nas mãos de Abner, acusou este de traçar uma tal Rispa, concubina do finado Saul. Abner ficou emputecido com a petulância da marionete:
— Peraí, peraí! Do que é que você está me acusando, Isbosete? De traição? Acha o quê? Que eu passei para o lado de Judá?
Mas eu só falei da Rispa…
— Não interessa! Você duvida da minha integridade, e isso eu não posso suportar! Eu sou fiel desde sempre à família de Saul, e se não fosse por mim você já teria caído nas mãos de Davi há muito tempo, retardado como é. E como é que Sua Majestade agradece? Me acusando de comer a amante do pai! Quanta gratidão, Isbosete! Mas quer saber de um negócio? Deus disse que tiraria o reino das mãos da família de Saul e o entregaria a Davi, que seria então rei de todo o Israel, de Dã até Berseba. Pois eu vou trabalhar para que isso aconteça, e que Deus me mate se eu não conseguir!
Dito isso, Abner saiu batendo os pés. Isbosete era rei, podia ter mandado prender o general por insubordinação ou qualquer outra coisa. Mas ele se cagava de medo de Abner, então foi chorar embaixo da pia.
Enquanto o patético rei de Israel chorava e tremia, Abner mandou uma mensagem a Davi:

Caro Davi,
Estava aqui pensando: a quem pertence a terra de Israel? Quem vai governá-la? Sabe o que eu acho? Eu acho que você deveria fazer um acordo comigo, aí eu faria todo o povo de Israel passar para o seu lado.
Atenciosamente,
Abner
Comandante do Exército Israelita

Davi ficou muito feliz com a proposta, mas tinha uma exigência a fazer. Então respondeu:

Caro Abner,
Excelente proposta. Aceito-a de bom grado, mas com uma condição: que você me devolva Mical, minha esposa. Se você vier até aqui sem ela, eu nem vou recebê-lo.
Davi
Rei de Judá

Pare reforçar sua vontade, mandou uma mensagem também a Isbosete:

Caro colega Isbosete,
Eu preciso reatar o casamento com sua irmã Mical. Seu pai me fez pagar por ela o preço de cem prepúcios filisteus. Eu fiquei tempo demais pegando naqueles pintos ensebados, para perder a mulher assim, de mão beijada.
Obrigado.
Davi
Rei de Judá

À primeira vista, parecia que Davi queria apenas resolver um problema antigo de orgulho ferido. Afinal de contas, Saul entregara Mical, a princesa que Davi desposara em troca de pele de pica, ao primeiro zé-mané que passou, um tal Paltiel. Não era só isso porém, e Abner sabia disso: oficializando sua condição de marido da filha do rei morto, Davi legitimava seu futuro reinado sobre todo o Israel. Para o inocente Isbosete, porém, parecia que Davi apenas queria de volta o que era seu por direito, então autorizou Abner a ir buscar Mical. O general tratou logo de ir. Entrou na casa de Paltiel e, com sua peculiar delicadeza militar, saiu arrastando a mulher pelo braço. O marido ia atrás dos dois, todo choroso e ranhento:
— Ô, seu Abner! Pelamordedeus, devolve minha mulher, vai. Eu só tenho ela neste mundo, mais nada. Devolve minha mulher!
E assim ele seguiu Abner e Mical até a cidade de Baurim. Então Abner, que não primava pela paciência, disse:
— CALA A BOCA, CARALHO! Coisa feia, um marmanjo chorando por causa de mulher, que vergonha! Volta pra casa, porra!
Sim senhor…
Figura deveras intimidadora, esse Abner. Paltiel voltou pra casa enxugando o ranho na manga da túnica. Abner, por sua vez, voltou ao Maanaim, e de lá convocou os líderes de Israel. Quando estavam todos reunidos, fez seu discurso:
— Já faz tempo que vocês querem que Davi seja o rei da coisa toda. Não, não neguem, eu sei disso. Sei e apóio a idéia. Ah, vejo que ficaram surpresos! Pois é, eu também quero que Davi seja rei de Israel. Esse Isbosete aí é um palhaço, uma vergonha para nossa nação. Lembram-se do que Javé disse, que usaria Davi para libertar Israel dos filisteus? Pois chegou a hora de dar uma forcinha para que a profecia se cumpra.
Os líderes aplaudiram Abner efusivamente. Tendo sido bem sucedido nessa primeira reunião, ele foi até a tribo de Benjamim para falar separadamente com seus líderes. Benjamim era território crítico: a família de Saul era originária da tribo, o que dava a ela importância política desproporcional a seu pequeno território. Para sua surpresa, porém, os chefes de Benjamim também queriam Davi como rei. Tendo o respaldo de todas as lideranças do reino, Abner foi a Hebrom acompanhado de vinte homens e de Mical, lógico. Quando Davi viu sua esposa voltando depois de tanto tempo, ficou muito feliz e deu uma festa em honra de Abner. Ao fim da noite, todo mundo já bem bêbado, Abner chamou Davi num canto e disse:
— Está tudo feito, Majestade. Eu vou voltar pra casa agora e conquistar toda terra de Israel para o senhor. Os líderes todos estão conosco, não tem como dar errado. Pode se considerar rei de Dã a Berseba.
— Ah, Abner! Primeiro você me traz minha mulher querida, agora me dá essa ótima notícia! Eu nem sei como te agradecer.
— Só não se esqueça de mim, Majestade.
— De maneira alguma.
— Muito bem, então. Vou embora agora.
— Vá em paz, meu irmão.
Estava selada a paz entre Israel e Judá, e Davi já podia se considerar soberano de todo o território israelita. Ele não contava, porém, com o sanguinário Joabe: o oficial do exército de Judá ainda daria muito trabalho.

4 comments

  1. SAAAAAAANNNNNNNNGUEEEEEEEEEEEE, o que o sanguinolento Joabe vai aprontar?
    Não perco o próximo capítulo nem morta.
    PS. Saudades dos posts diários.
    Beijim.

  2. Realmente o texto está bem escrito. mas não pode-se esperar que cada capítulo trará um gancho para sátiras fabulosas. Um conselho de seminarista, você poderia escolher livros da bíblia fora da seqüência, há textos com mto pango prá manga e menos complexos de se humorizar. Jonas, Cântico dos Cânticos ou Salmos, por exemplo. O novo testamento dá pouca margem. Espero tê-lo motivado, contudo sei q há outros motivos para a “falta de criatividade”. Um abraço!

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