Tia Rita

Ok, acho que o autógrafo da Rita Cadillac merece uma explicação. O que nos leva a mais uma da série

HISTORINHAS INTERMINÁVEIS
DO MARCO AURÉLIO

Foi em 1999. Começo de 2000, talvez. Eu trabalhava no Largo do Arouche e às vezes ia almoçar no La Farina, excelente restaurante italiano, a não ser pela localização: No miolo da boca do lixo, Quase esquina da Aurora com a Sâo João. Passando em frente a um dos maiores e mais sujos puteiros (As deusas do sexo proporcionam a você horas de prazer, fantasia e libido, é mais ou menos o lema da casa escrito na fachada), vi um cartaz anunciando o próximo show. Quem senão a musa do Carandiru, Rita Cadillac. Voltando do almoço, liguei para os amigos e, para minha surpresa, todos se empolgaram com a possibilidade de assistir a Rita ao vivo.
No dia marcado, lá fomos nós: Eu, Risadinha, Zezinho e os dois Loxas. Quando o Zezinho viu a cara do lugar, quase deu meia-volta. Bocada mesmo, decadência total. Mas acabamos entrando, e ele até que ficou à vontade, comeu até umas frutas da Festa do Havaí que estava rolando na recepção. Lá dentro ouvíamos o grande hit de então, “Uh, Tiazinha” e nos empolgamos. “Bora, bora, vamo entrá que o bicho tá pegando lá dentro”.
Meu deus. Visão apocalítica: Uma mulher muito gorda, de lingerie preta, cinta-liga, chicotinho e máscara. Não tinha celulite, tinha fendas geológicas na bunda. O palco tinha uma daquelas barras verticais, que todo mundo já viu em filme: Uma barra cilíndrica de metal, usada para incrementar a performance da moça. Pois bem, cada vez que a gorda vinha e rodopiava na barra, o negócio rangia, o palco tremia, e dava a impressão de que tudo podia desmoronar a qualquer momento. Para não ficar traumatizado com a cena daquela bunda gigantesca sacolejando, olhei para o fundo do palco, onde havia uma tela branca. E na tela uma barata do tamanho da minha mão. Odeio baratas.
— Caralho, Zé. Tem uma barata ali.
— Onde?
— No fundo do palco, na tela.
— É uma mancha, Marco Aurélio.
— É uma barata, porra.
— Que barata! Onde já se viu barata desse tamanho? É uma mancha, olha lá, uma man… Ai caralho, a mancha tá andando! VOOU!
Nojento. E tudo era tosco: Os shows, as dançarinas, as meninas que circulavam pela platéia. Uma das máquinas de gelo seco quebrou, e o cara subiu ao palco para consertar no meio da apresentação de uma loirinha magra com pele de papiro. Uma outra menina subiu ao palco, respirou fundo e a música começou.
— Não é essa música — Ela gritou para o DJ. — É a número 6.
O cara trocou de música.
— Não! Não é essa, porra! A SEIS! SEIS!
Bom, o cara trocou de música várias vezes, nenhuma era a certa, e a menina saiu do palco chorando sem ter feito sua apresentação. Outra moça veio dançar na platéia e ficou rebolando no colo de um assustado Risadinha. Tá, essa parte foi divertida. Assim como as pulgas que os Loxas pegaram porque não quiseram ficar sentados com a gente porque tinham nojo das cadeiras. Se foderam.
Mas todos os percalços valeram a pena para ver Rita Cadillac subir ao palco. O público — pedreiros, motoboys, office-boys, cobradores de ônibus e cinco profissionais de informática — delirou. Ela jogou beijos, chamou todo mundo de amor, aquelas coisas. O DJ colocou a música para ela dublar e dançar. “É bom para o moral”, um clássico de Rita Cadillac. E era em vinil riscado o negócio, uma chiadeira filha da puta. Não importa, o negócio era assistir aquele rebolado clássico. Que beleza! Eu, palhaço que sou, tinha levado a Sexy em que Rita havia saído no mês anterior e mais um pôster gigante, também da Sexy, para o qual ela havia posado anos antes. Vendo aquilo, ela percebeu que se tratava de um fã. Para sorte minha, não me chamou ao palco nenhuma vez. Embora tirar a calcinha da Rita Cadillac com a boca fosse enriquecer meu currículo, sou muito tímido para essas coisas. Porém, quando ela veio descendo do palco olhando e apontando pra mim, já sabia o que me esperava: Parou na minha frente, virou de costas e empinou aquela bunda enorme. Não tive dúvidas, conheço o ritual: Tasquei um beijo. Olhei pra trás e o Loxinha estava gritando “NÃO ACREDITO! NÃO ACREDITO! MUITO FODA!”. No fim das contas o teatro inteiro beijou aquela bunda, que deve ter ficado toda melecada. Mas eu fui o primeiro.
Bom, depois do show, fomos ao camarim. “Camarim” é modo de dizer: parecia um banheiro de rodoviária, mas sem privada nem pia, claro. Já vestida, Rita Cadillac é uma tiazona daquelas bem gente boa, então fiquei com um pouco de vergonha de abrir a revista e pedir para aquela senhora autografar a própria bunda. Mas, que diabo, já tinha chegado até lá. Então pedi um autógrafo para mim na revista e outro para o Loxinha no pôster, já que o moleque tinha se divertido tanto.
Voltamos para a platéia, porque começou a rolar um show de sexo explícito, aquelas acrobacias todas. Depois de um tempo o negócio foi ficando chato, então resolvemos ir embora.
Ah, claro: Precisamos arrastar o Zezinho, ou ele estaria lá até hoje.

Deixe uma resposta