Futurismo

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Teleportec: coisa do cão


Já ouviram falar num treco chamado Teleportec? Vi esse negócio em funcionamento ontem e fiquei besta. Sim, mais ainda. Estava cobrindo um evento, e os organizadores anunciaram que um dos palestrantes participaria a partir de seu escritório em Dallas, via Teleportec. “Tucanaram a videoconferência”, pensei. Bobagem minha. Nem o equipamento nem o palestrante eram banais.
Manjam pára-brisa de lancha? Então. Imaginem um pára-brisa de lancha de cabeça para baixo e com a parte côncava voltada para a platéia, incrustado num púlpito de madeira. Aparentemente era só isso o tal Teleportec: vidro e madeira. Bestagem, frescura de design. Pelo menos até o momento em que foi posto em funcionamento: de repente, vindo do nada, o palestrante materializou-se atrás do púlpito. Sorridente, mãos apoiadas sobre o tablado, um pouco transparente aqui e ali, o homem parecia um fantasma camarada.
Pelo que me explicaram, o funcionamento do equipamento é relativamente simples: o palestrante se posta frente a um fundo verde, como no velho truque do cromaqui. Na outra ponta, a imagem é projetada no vidro sem o fundo. Como o vidro é transparente, a imagem projetada se sobrepõe ao fundo local (no caso de ontem, as cortinas do teatro). O formato do vidro, dobrado nas laterais, completa a ilusão de três dimensões. Coisa do cão.
Kurzweil: o próprio cão

Kurzweil: o próprio cão


O cão, nesse caso, incorporou-se no palestrante, Ray Kurzweil. Ao que tudo indica, o sujeito tem em casa uma máquina do tempo. Na década de 80 previu que o mundo inteiro estaria conectado a uma rede mundial de computadores na metada da década seguinte, e que o genoma humano estaria mapeado no começo do século seguinte. Ninguém acreditou nele. Nem Watson e Crick, que desvendaram a estrutura do DNA, botaram fé num mapeamento tão rápido do genoma — falavam em cem anos. O que aconteceu? Bingo para Kurtzweil nos dois casos.
Ele jura que não é feitiçaria, e que não viaja ao futuro para trazer essas informações. Segundo o inventor (o cara criou o reconhecedor óptico de caracteres, o sintetizador musical, o scanner, o software de reconhecimento de fala), toda tecnologia tende a dobrar sua capacidade de um ano para o outro. Em 2005 você compraria uma câmera de 3 megapixels para uso cotidiano, hoje não compraria uma com menos de 6 megapixels. Aquele seu microcomputador que tinha 512 megabytes de memória anda precisando de um upgrade para 1 gigabyte. Agora imagine isso em dez anos: é multiplicar a capacidade por 210, ou 1024. Tecnologia que se torna mil vezes mais poderosa a cada dez anos (um milhão a cada vinte anos, um trilhão a cada trinta anos, e assim por diante) faz a gente repensar algumas previsões de malucos como Kurzweil.
Ele falou, por exemplo, de um negócio chamado Respirocyte, uma célula sangüínea artificial, ou melhor, um nanorrobô programado para agir como glóbulo vermelho. Não só isso: experiências com cobaias mostram que as células artificiais podem ser programadas para tarefas diversas como, por exemplo, reconhecer padrões incomuns de divisão celular — em outras palavras, detectar e destruir células cancerosas. Imaginem a aplicação dessa tecnologia no tratamento pós-cirúrgico, substituindo quimioterapia e radioterapia, que são invasivas e debilitadoras.
Segundo o cientista, no futuro poderemos reprogramar nossa biologia para combater doenças. Poderemos implantar nanorrobôs no organismo e baixar software da internet para programá-los para realizar diversas funções. Enquanto esse dia não chega, Kurzweil adota uma dieta incomum: ingere diariamente 250 suplementos alimentares, 8 a 10 copos de água alcalina (será aquela que o passarinho se recusa a ingerir?) e 10 xícaras de chá verde. Ele diz que fez um teste aos 40 anos de idade para determinar sua idade biológica, e descobriu que tinha um corpinho de 38. Hoje, aos 58, alega ter 40 anos de idade biológica, ou seja, ter envelhecido apenas dois anos nos últimos 18. Para quem quiser experimentar, está aí a receita.
Respirocyte: o Terminator celular

Respirocyte: o Terminator celular


Além do uso da nanotecnologia para fins biológicos e medicinais, Kurzweil é um entusiasta da inteligência artificial. Sempre levando em conta o crescimento exponencial da capacidade tecnológica, ele prevê que em 2029 teremos concluído a engenharia reversa do cérebro humano, o que permitirá a construção dos primeiros computadores verdadeiramente inteligentes. Para antes disso, em 2010, ele prevê a morte do computador como o conhecemos. Equipamentos eletrônicos minúsculos e onipresentes, conectados à internet am alta velocidade e sem fios, farão as vezes dos trambolhos que temos sobre nossas mesas hoje em dia.
Segundo Kurzweil, essas diversas evoluções da tecnologia levarão a uma singularidade, um momento em que o desenvolvimento da tecnologia será mais importante para a espécie humana do que a evolução natural, muito mais lenta. Ele lembra que, mesmo depois de termos computadores inteligentes, a inteligência artificial continuará se desenvolvendo a taxas exponenciais, enquanto a inteligência natural é, por definição, fixa. Além disso, ele acredita que em vinte anos começaremos a incrementar a cada ano que passa um ano à expectativa de vida das pessoas.
Imaginem agora um planeta em que as pessoas demoram para morrer. Os sistemas previdenciários de hoje não farão sentido num mundo em que viver 100 ou 120 anos é a regra. Essa longevidade tem um preço: a implantação de nanomáquinas na corrente sangüínea, na pele, no cérebro. Nanomáquinas cada vez mais inteligentes, assim como suas parentes grandes, convivendo conosco, seres de inteligência limitada. À sutileza de raciocínio e ao reconhecimento de padrões típicos da mente humana, esses dispositivos somarão a velocidade, memória e capacidade de compartilhamento das máquinas.
Não sei quanto a vocês, mas após a palestra de Kurtzweil eu consegui resumir todas as implicações dessa realidade futura numa só palavra: fodeu.

45 comments

  1. “Equipamentos eletrônicos minúsculos e onipresentes, conectados à internet am alta velocidade e sem fios” = palm (ou pocket) com wifi… já existe hoje, é só melhorar a infra-estrutura. não é difícil, basta vontade (e um “pouquinho” de grana).

    Resposta do autor:

    É verdade, mk. Mas quando eu falo em “minúsculos”, quero dizer minúsculos mesmo: nanotecnologia, coisa de frações de mícrons. PDAs são trambolhos gigantescos e desengonçados. Estou falando de equipamentos que podem ser implantados entre as fibras do tecido da sua camisa. Onipresentes de verdade.

    Quanto eu falo em internet em alta velocidade, é alta velocidade mesmo. Terabits por segundo. Nem precisa tanto: gigabits já ajudam. E esse acesso é em todo lugar, não só na sua casa ou nas proximidades de um hotspot WiFi. Isso é tudo muito velho.

  2. Caro escriba, dado esse seu interesse por nanotecnologia e afins, me permita recomendar o blog Vida Digitao (vidadigitao.blogspot.com), de um amigo.
    Ele é da área de tecnologia, e coincidentemente abordou o tema esta semana, questionando inclusive a necessidade do corpo físico no futuro.
    Ah, e ele já conversou pessoalmente com Elias.

  3. Não sei aonde eu li que o corpo humano está mais pra uma colônia do que pra um organismo único, e se somos simbióticos, nada mais natural do que a próxima evolução ser esta.

  4. Pôrra, tudo muito foda! Pra galera da tecnomania (não aquela que vende a TecPix) é fantástico!
    Imagino a situação: cérebros com células artificias se comunicando na rua através do bluetooth. Acabaria com a comunicação falada…
    E de tudo isso, há algo que eu gostaria de fazer: ingerir diariamente 250 suplementos alimentares. Só acho inviável fazê-lo usando apenas 8 a 10 copos de água alcalina e 10 xícaras de chá verde. Daria aproximadamente 12 suplementos pra cada copo / xícara.

  5. Caraleo! Eu sempre fui um intusiasta da tecnologia. Mas, vendo desse modo, assumo que fiquei assustado. Será que o futuro vai ser como o Spilberg pensou pra “Inteligencia Artificial”?

  6. Essa semana tava lendo sobre uma pílula que você engole e ela têm uma câmera que transmite as imagens via rádio a um computador. Eles usam pra localizar pólipos que podem virar câncer no intestino delgado, que até então não podiam ser detectados, já que os exames só atingem o reto. Como a pílula é barata, vc não precisa nem resgatá-la.
    É foda, nem de câncer vamos poder morrer em paz.
    Aliás, tô com uma dor na bola esquerda do saco…

  7. Que merda é essa chicoteia?
    Se eles forem mais inteligentes e “dominadores” que os humanos nos dançamos cara.
    Será pior que a Matrix. Não vai ter chicotinho na nuca pra gente desplugar… o treco já estará embutido no cérebro.

  8. Cara, isso tudo me dá muuuito medo. Não consigo acompanhar nem a tecnologia de hoje (e olha que eu só tenho 18 aninhos), se tudo continuar crescendo nessa proporção, vou me isolar no meio da floresta (se sobrar alguma, claro)

  9. Baixar softwares para reprogramar células artificiais baseadas em nanotecnologia… Imagine só quando inventarem vírus para esses softwares… Dependendo do modo como ele se alastrar e o tipo de dano que ele vai causar, isso pode ser mais perigoso que uma arma de destruição em massa dos tempos atuais.

  10. Eu quero viver cem anos, você quer viver cem anos, todo mundo quer viver cem anos e, pelo que aponta a tecnologia, todos nós teremos essa chance. Junte a isso a queda da taxa de mortalidade infantil e a cura de inumeras doenças que matam milhões de pessoas por ano. Misture tudo e compare o resultado com a velocidade com que consumimos os de recursos naturais do planeta. É assustador… Toda semana sai uma nota – minúscula e assustadora – em todos os jornais apontando algum estudo que diz que em 50 ou 100 anos os recursos naturais do planeta não darão mais conta de sustentar a população de humanos. Outras espécies, animais e vegetais, que nos oferecem sustento estão também desaparecendo em velocidade tão exponencial quanto o desenvolvimento dessa tal tecnologia que nos ajudará a ter uma vida maior e melhor. Sinceramente, as duas únicas tecnologias que vao me tranquilizar são a sintetização de alimentos à partir de compostos não-orgânicos e a viagem de espacial à velocidades superiores à da luz. Só assim a raça humana terá a chance de viver mais mil anos, nem que seja se alimentando de pozinhos coloridos num planeta inóspito há cem anos luz daqui.

  11. Por isso que toda vez que olho pra minha prova de Inteligência Artificial e vejo que tirei 7 eu fico feliz, isso não é coisa de gente normal não!
    Se o Sr. Kurzweil acertar novamente suas previsões realmente fodeu, porém acho que sobre a evolução da Inteligência Artificial não daria em algo tão superior pois a mesma ainda é criada pelos homens então é tão limitada quanto, pode ser que aconteça o mesmo esquema de calculadoras por exemplo, elas resolvem as contas bem mais rápido, mas não é nada que não possamos fazer.

  12. Bill Joy, da Sun, há alguns anos já falava sobre o potencial risco do advento de novas tecnologias, como a nanotecnologia, e propunha limitações nas pesquisas dessas tecnologias. Caso ainda não tenha lido o artigo “POr que o Mundo não Precisa de Nós”, é um bom contraponto a esse otimismo (não que eu concorde totalmente, é apenas mais um ponto de vista sobre o tema). O artigo pode ser lido aqui:http://amanha.terra.com.br/edicoes/154/wired_print.htm

  13. Sempre fui um leitor assiduo de ficções científicas e espectador frequente de filmes do mesmo genero. Creio que as pessoas que possuem o mesmo hobby não se supreendam com este tipo de notícia.
    “ESTAVA ESCRITO….” amen

  14. Foldeu pra nós, mas o Chuck Norris tá cagando e andando.
    Eu e meu futuro fiu já estamos decididos do nosso futuro: vamos viver na selva amazonica ou no Congo junto com o King Kong…

  15. Bom texto, Marco, mas sempre fico encucado com esse negócio de inteligência artificial e nanotecnologia. Eu sei que são só filmes, mas já imaginou um computador inteligente feito aquele (acho que o nome é HALL2000) que num filme (o qual não recordo no momento) mata todo mundo pra não descobrir que ele cometeu um erro? Os sentimentos humanos estão no cérebro, certo? Se conseguirmos dar a uma máquina toda a capacidade do cérebro humano teremos uma máquina que pode vir a ter sentimentos. Imagina o estrago (exterminador do futuro) que uma máquina imbuída do mais puro sentimento de vingança poderia causar… E a nanotecnologia que acompanha a inteligência artificial então? Se o Doc Octopus (homen-aranha 2) não for uma previsão do futuro, não sei o que pode ser… Mais uma vez são só filmes, mas, e se eles tiverem razão? A mania que o ser humano tem se achar Deus (criando coisas sem pensar nas conseqüências) vai acabar levando o ser humano a cometer exatamente o mesmo erro que Deus: criar algo tão parecido com ele próprio que vai acontecer de a criatura exterminar o Criador…

  16. dá a maior medona desse tipo de profecia-apocalíptico-científica. fico imaginando meu netinho, com todas as suas funções humanas perfeitas (?), mas com cara de damian,aquele do filme “a profecia”.

  17. É triste… eu vejo uma foto do Beiramar e venho no blog do Marcurélio… Vejo que o João Gilberto tem uma filha de dois anos… e corro pra cá de novo… Que sociedade é essa em que a gente conhece as pessoas sem que elas nos conheçam???

  18. Não concordo com o Daerson na sua afirmação “Eu quero viver cem anos, você quer viver cem anos, todo mundo quer viver cem anos…”. Tenho 40 anos e quero viver, no máximo mais uns 200 anos… Mas já vi uma vantagem na nanotecnologia: imagina não precisar do tradicional exame de próstata… (acho que nano, que equivale a 1000E-3 ainda é muito grande para isso… tinha que ser menor, como pico, equivalente a 1000E-4… o problema é falar que colocou lá atrás um “apareinho” do tamanho de 1 pico (UM O QUÊÊÊÊÊÊÊ????))
    eheheheh

  19. Em tempo: concordo com a Lila lá em cima e lhe pergunto: “Será que, com toda essa evolução prevista, você consegue reescrever o Apocalipse antes que o próprio aconteça?” É sério, “véi”! Esse é o livro bíblico que eu estou mais ansioso pra ler.
    No mais, fica o Abraço!

  20. Fodeu com força. Toda ficção científica tem um fundo de verdade. Essa história de AI é uma roubada! Nós, como os dinossauros, estamos ensaiando o fim da nossa raça…

  21. Marco, se você me permite a intromissão, eu gostaria de responder à pergunta da Raquel lá em cima. A Raquel perguntou qual é, então, o título do post, já que você não é um boçal sem criatividade. Bem, boçal sem criatividade eu até posso ser, mas se tem um título que combina e acaba sendo uma nova versão do ‘Admirável’ é: “Abominável mundo novo”. Que tal? E você, Raquel, o que acha?

  22. Posso tirar uma onda? Ah, deixa… Só um pouquinho… Pois bem… Desse negócio de “reprogramar nossa biologia para combater doenças” eu sei há uns 4 anos. Tenho dois amigos – amigos mesmo, daqueles de infância e poder mandar tomar dentro que nada acontece – que me falam disso desde os primórdios desta pesquisa. Um deles é simplesmente responsável pelo laboratório da UFRJ que estuda PIONEIRAMENTE o Projeto Genoma. Tal laboratório é o que colocou o Brasil no pelotão de elite da pesquisa mundial sobre o código genético humano. Alguns dos programas que rodam e fazem este tipo de pesquisa foram criados por ele e estão instalados em computadores daqui e do exterior. O outro amigo, perdoe-me a falta de modéstia, Marco, mas é que me orgulho MUITO MESMO DELES – é um cara que na mais tenra adolescência me dizia: “Ou vou tocar guitarra ou vou ser químico”. Sabe fazer os dois, mas prefere a Química. Pulou da Graduação para o Doutorado, direto, sem mestrado. Seu pós-doutorado, no entanto, é coisa que poucos conseguem. Ele trabalhou com George A. Olah, o ganhador do Prêmio Nobel de Química de 1994. Este meu amigo é especialista em carbono, petróleo, essas coisas… Mas ele afirma até hoje que o mapeamento genético será o golpe mortal no câncer. Sem trocadilhos. Você, num futuro não muito remoto, poderá “quebrar” a seqüência reprodutora da célula subversiva e pode induzi-la a matar suas “correligionárias”, se é que me faço entender. Estes dois camaradas, que me dão “notícias do futuro” são meus padrinhos de casamento. Tá vendo? Não sou pouca merda…

  23. Fico só imaginando todas essas marilhosas inovações tecnológicas disponiveis e o negrinho lá no morro continuando ignorante a respeito de tudo isso.Vai ser mais um modo de exclusão como a internet já o é hoje…

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