Tecelão

O Jubilado comentou que o Carioca traz um Chico Buarque “… mais maduro, mais musical”. Como se ele tivesse gravado Construção em 1971, aos 27 anos de idade, e só reaparecesse agora, aos 63. Esquece-se o leitor que Chico Buarque gravou o bom Cambaio em 2001 e o excelente As Cidades em 1998. Era ele menos maduro então? Era nada!
Nego agora vai dizer que estou seguindo a modinha de falar mal de Chico Buarque. Num outro blog em que escrevo um sujeito falou em hype e sei lá o quê. Típico pensamento de gente besta: se tantos falam mal de Carioca, isso é uma modinha. Não pensam que pode haver uma outra razão, mais clara e simples: tantos falam mal porque o disco é ruinzinho mesmo.
Eu tenho todos os discos de Chico Buarque (não me canso de dizer isso), e esse último é, sem dúvida, o pior. Chico era um tecelão da canção popular. Em suas composições, a letra era a trama, a música era a urdidura. O resultado era — quase sempre — maior do que a soma das partes. Letra e música de Pedro Pedreiro, Construção ou Moto-Contínuo tomadas em separado não têm o mesmo valor que as canções completas. Em algumas ocasiões essas composições atingem a perfeição ao encontrarem o intérprete ideal — foi o que aconteceu com A Bela e a Fera gravada por Tim Maia (todo o disco O Grande Circo Místico é feliz nesse quesito, exceçaõ feita à sempre dispensável Simone).
Acabou-se o tecelão. Letra e música podem ser separadas, embaralhadas, jogadas no lixo. Parcerias com gente sem talento, como Carlinhos Vergueiro e Ivan Lins, apenas reforçam a impressão. Repetições fazem lembrar O Rappa. A letra de Ela Faz Cinema parece originada de um pagode dos mais safados.
Talvez fosse o caso de Chico Buarque tomar a decisão que adia há anos, de dedicar-se exclusivamente à literatura. A excelência de Budapeste lhe dá créditos para tanto. Um livro mais, ou dois. Depois, quem sabe, longe da obrigação de compor, ele possa reencontrar o velho tear.

24 comments

  1. Eu não ouvi o disco, mas não duvido da sua avaliação. A única coisa que me espanta é você decretar o falecimento do Chico por causa de um único disco. É mesmo para tanto? Considerando que o disco seja realmente uma porcaria, não pode ter sido apenas um deslize passageiro, totalmente perdoável em uma carreira tão extensa e produtiva e que será esquecido depois da próxima prova de genialidade dele?

  2. A solução que proponho é radical, mas humana:
    – Sacrifiquem o animal-humano “de Holanda”
    Não percebem que ele está sofrendo? insandecido ao ponto de gravar AQUILO?!?!?!?
    Chicória, PARE DE SOFRER!!!
    (Também tem sempre a opção de canja de galinha dá avó… Vai que da certo?)

  3. Você sabe que unanimidades como Chico, Caetano e cia. são venerados mesmo quando fazem as maiores merdas. O Chico perdeu completamente o pé da història quando a ditadura acabou…

  4. Proponho que ele se mude de uma vez p/ Cuba.
    Será que ele tem a manha? Trocar Paris por Havana? Ou o apoio ao ditador da ilha-presídio é só garganta mesmo?

  5. Olha, não ouvi Cambai. Mas qdo escutei o CD As Cidades já achei que o Chico tinha dacído um pouco. No passado, como na própria música citada, Construção, ele era muito mais genial que agora. Não quero dizer que ele seja ruim. Ele está ruim. Isso não tira o mérito de suas músicas antigas, maravilhosas, que smp adorei.

  6. Vou ser sincero. A única música do Chico que sei de cor eh “A Banda”. Mas eu gosto de uma outra que não lembro o nome. Lembro de ‘os meninos na rua jogam futebolas vezes chove as vezes faz sol’.
    Mas isso não vem ao caso.
    Não consigo abrir o arquivo do êxodo, isso é ruim?
    O.õ

  7. Marco, não acredito que um sujeito que está há trinta anos compondo, fazendo músicas e sendo gravado até hoje como o Ivan Lins não tenha talento. Seria um caso quase único. De cabeça, não me lembro de outro. Além do mais, acredito que “Renata Maria” (apesar do nome da sujeita) seja a melhor música de “Carioca”. Mas, vá lá, opinião é como bunda: cada um tem a sua, né não? E faz o que bem entender com ela…
    Quando ao resto do CD, um amigo meu, fã incondicional do Chico, me disse: “Realmente, o seu Chico tava precisando de um capilé… Fazendo show ele ganha mais do que com os direitos dos livros dele.”
    O negócio é que Chico pode muito bem fazer uns 100 shows com repertórios variados. Se for pra fazer como em “Carioca” é melhor dar um tempo mesmo. E em literatura sempre se corre o risco dele fazer um outro “Estorvo” (que pelo nome não se perca).
    Em tempo: não sou fã de Ivan Lins. Mas não devo deixar de dizer que “Acariocando” é um dos melhores CDs que ouvi este ano. Pode ser sorte, sei lá. Mas que eu achei, achei.
    Amplexos.

  8. Marco Aurélio,
    Cometeste um equívoco em incluir o Ivan Lins no grupo dos sem talento. Acho que você não deve conhecer a obra completa dele, só as parcerias com a Simone e os últimos programas que fez no Jô Soares.
    Quanto ao Budapeste, seria bom repensar.
    ABRAÇO

  9. marco, a fernanda young diz falar mal dela tá na moda, desconsiderando a possibilidade dos livros serem uma merda. o chico fez um disco medíocre (não adianta: é nada mais que isso, em todos os aspectos. não dá pra dizer que tem UMA canção que é melhor que “boa”). isso seria aceitável pra maioria dos compositores, mas não pra um cara do naipe dele. acho que ele podia fazer como os outros, pra ganhar dinheiro: lança mais uma versão acústica do melhor que já fez na vida e enche a burra de grana. esse show eu ia 😀

  10. Marco Aurélio,
    Olha..quando li o post não deixei de vir aki comentar…
    Sinceramente..vc tem TODA razão…Também tenho toda discografia do Chico e esse ultimo trabalho dele…ficou…pífio?! ..acho que é pra ganhar dinheiro com show mesmo.
    Cambaio foi muito bom…estou ouvindo Veneta ^^
    Agora…quanto ao ivan lins…pq vcs canonizam tanto ele????
    a unica musica dele da qual me recordo eh “vitoriosa” eh olhe lá..
    Concluindo sobre o Chico…vc também não teve a nítida impressão de que todas as desafinadas q ele salvou durante a vida ele colocou nesse disco??
    aham…é de doer os ouvidos…
    Tata

  11. Discordo.
    Pra mim o Carioca não é ótimo, mas é melhor que o “As Cidades” e tb melhor que “Cambaio”(desse eu não gostei mesmo). O Chico na verdade, parece que de uns 10 anos pra cá vive de um única fórmula músical que está acima da média, mas é repetitiva, enjoativa. O último álbum que eu gostei dele foi o “ParaTodos”. Como escritor, aí me desculpem, eu não li O “Budapeste” pq pra mim “Estorvo” e “Benjamim” foram suficientes… e péssimos.

  12. Marco Aurélio
    Vim para o escritório escutando cd Carioca e pensando em mandar uma chicotada falando bem do disquinho.
    Mudei de idéia depois de receber um link com a entrevista do Chico para um jornal argentino.
    http://noticias.terra.com.br/eleicoes2006/interna/0,,OI1135817-EI6652,00.html
    O Chico tem mais é que ser exilado em Cuba.
    Ele merece ficar ouvindo discurso do Fidel até o fim dos tempos.

  13. Não é o melhor disco do Chico, mas gosto mais que de Cambaio. Talvez porque a peça tenha me decepcionado, sobretudo nas “leninadas” da produção musical. Já “As Cidades”, concordo plenamente, é infinitas vezes melhor. Gosto de “Ela faz cinema”. Não gostei da escolha da Monica Salmaso pro disco, que, tirando a versão para “A Violeira”, melhor que a Elba, eu acho um saco.
    Detesto Ivan Lins, mas a Elis deixava as músicas dele legais. Talvez isso explique tantos anos aí, o talento era o da Elis (e ele teve coragem de dizer, não lembro onde, que as músicas dele alavancaram a carreira dela).
    Não acho Budapeste uma obra prima da literatura e nem que o Chico deva parar de cantar e lançar discos, porque um show do Chico é sempre bom, mesmo com a péssima organização e todo o desconforto do Tom Brasil – credo, e no ingresso dizia área vip!
    Momento tiete incondicional: Ai ai, ele é tão charmoso que nem precisava cantar, bastava sorrir no palco que já valia… (suspiros).

  14. Marco, sou fã do Chico e, como você (no bom sentido), tenho todos os seus discos. Concordo plenamente com tua análise e, sobretudo, com a perfeita comparação entre o disco novo e As Cidades, que é genial. É isso. Mas, para não perder o embalo, e mudando de pinto pra pênis, te digo que escrevi lá no blog um certo Retorno Frustrado de Jesus à Terra, que gostaria que você lesse, quando tiver tempo. Grande abraço!

  15. Olá Marco, que engraçado essa coisa de gosto, né mesmo? Você não gostou do disco … tudo bem, mas que peninha! Será que eu posso discordar sem ser chicoteada? hahaha
    Eu estou aqui, aos prantos ouvindo “dura na queda” e pensando … meu Deus, Chico é um gênio! Que letra, que letra.
    Em “outos sonhos” a imagem dos “guris” inértes no chão falando de astronomia, o morro com som belo e sereno, que coisa mais linda gente!
    O mesmo eu digo de “ode aos ratos” que na minha opinião é uma canção que só um olhar sensível como o de Chico poderia ter concebido. Eu a comparo com “brejo da cruz” e “meu gurí” que me chamam pra uma reflexão profunda. Não vejo ninguém no cenário musical brasileiro cantando esses conflitos e sofrimentos da sociedade brasileira, ainda mais de forma tão rica.
    “…andam nús pelas quebradas seus exus, não tem turista, não sai foto nas revistas…” Pra descrever com tanta propriedade e de forma tão linda e poética a grandeza e as mazélas do subúrbio carioca como Chico fez, tem que se ter convivido, observado e sentido aqueles bairros, não é pra qualquer um não.
    Haaaa “leve” que sutileza, que delícia! Qual a mulher que nunca foi dispensada por um cara assim, de leve? Eu já! hahaha! Isso sem falar nos pontos da cidade como pano de fundo, o passo, o cais do porto, o planetário, a lagoa, a praia … Que delícia! Tá vendo, again, tem que ser mulher e carioca pra sentir no core o que eu sentí ao ouvir essas músicas!
    Esse disco pra mim é uma lindíssima declaração de amor ao Rio e as mulheres. Eu recebí e aceitei! Obrigada Chico!

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