O lançamento

Pois muito bem. Eu e Paula chegamos ao Bar Balcão por volta das oito da noite. Fomos recepcionados por um feliz Polzonoff:
— E aê, como vai essa força? Olha, melhor vocês subir logo, que o negócio tá pegando fogo lá em cima!
Ele vestia uma camiseta justa com uma foto do Che Guevara — que deixara levantada até o peito para poder coçar o umbigo à vontade —, calção de futebol e sandálias de imitação de couro. Na mão que não coçava o umbigo, segurava um copo de Jurubeba Leão do Norte.
Subimos e encontramos Paula Foschia no meio do pagode que estava mesmo pegando fogo. Sambava em cima da mesa, de shortinho Bad Boy (aquele que faz a bunda das mulheres olharem feio pra gente) e blusinha de strass (é assim que se escreve?). Acenamos para ela e fomos apresentar nossos cumprimentos à figura central da noite: o autor.
Alexandre Soares Silva estava sentado na roda de samba, tocando seu inseparável cavaquinho apoiado na barriga. Cantava mais alto que todo mundo; aparentemente o palito na boca não atrapalhava. Vestia-se em seu estilo inconfundível de aristocrata: camisa de viscose estampada aberta até o peito (para mostrar seus cordões de ouro), pochete na cintura, anel de ouro no mindinho de estimação (aquele de unha comprida), calça de moleton, havaianas. A cabeleira prateada estava empastada de gel. Uma beleza.
— Boa noite, Alexandre. Parabéns pelo lançamento.
— Queisso, rapaz, queisso! Abundem-se aí. Ô MANÉ! TRAZ UMA LOIRA GELADA AQUI PRO MEU CAMARADA E SUA COMPANHEIRA, FAZ FAVOR! E aí, Marco, como vai essa força?
— Er… Força? Bem. Acho. Sei lá.
— Hehehe. Sempre um piadista! — aqui ele me deu um soco no ombro — E aí, já comprou o livro?
— Vou comprar assim que a Paula descer da mesa…
— Ah, sim. Claro. Mas compra sim, viu? Pra me ajudar, sabe como é. Além do mais, você vai gostar.
— Vou, é? E sobre o que é o livro?
— Ah, é um soco no estômago, sabe? Um SOCO NO ESTÔMAGO! É um romance transgressor, visceral, sórdido. A história se passa na cidade de Cabrobó Roxo, sertão do Piauí. O personagem principal é Dundas, um filhote de jegue metido a detetive.
— Peraí. Filhote do quê?
— Jegue, o animal símbolo do nosso Brasil e de seu povo sofrido.
— Ah, sei.
— Então. A investigação da morte de vários animais da caatinga. São mortos um calango, dois caburés-de-orelha, três jegues, dois carcarás, um acauã e um tatu-peba. No entanto, Dundas só é chamado quando um veado-catingueiro elitista é assassinado. Ele começa sua investigação e… Bom, mas tudo isso é só um pretexto para denunciar as reais condições da grande massa de miseráveis nesse interiorzão de meu Deus.
— Ah, é?
— É! Veja, o romance é uma alegoria do que acontece nessa sociedade injusta e cruel.
— Sei, sei… E você espera vender bastante?
— Estou contando com isso! Não vejo a hora de ler o que vai sair sobre o livro nos jornais. Tomara que dessa vez a crítica se lembre de me elevar ao patamar de Marcelo Mirisola e Fernanda Young…
— Puxa. Estou torcendo por você, Alexandre.
— Obrigado, obrigado. E, Marco?
— Sim?
— Não deixe de comprar o livro, ok?
— Vou comprar.
Fui até a mesa onde estavam empilhados os exemplares e peguei dois. Levei-os para que Alexandre os autografasse. A dedicatória que ele fez para mim:

Marco Aurélio,

Um soco no estômago. A vida é assim, cara! É assim!

Abraço do seu camarada,

Alexandre.

E foi assim.
Juro.

27 comments

  1. eu não sei quem é ninguém, a não ser de blogs, mas eu tenho certeza que isso é alegoria. principalmente a parte de querer se elevar ao patamar do mirisola.
    boa noite, marco. beijo pra tu.

  2. É verdade e dou fé.
    Porém Marco, faltou mencionar que ao final do evento o senhor Alexandre, já totalmente embriagado, se atirou em seu chevette amarelo com carburador de opala e convocou a todos o presentes a participar de sua romaria noturna pelo cirquito de “botecos inóspitos da periferia” (que é, segundo o Autor, sua fonte quotidiana de inspiração). Antes de partir, colocou a cabeca pra fora da janela e gritou gritou seu já famoso bordão: “Eu mijo na boca da literatura burguesa!”. Depois disso ouvimos apenas o som dos pneus fritando o asfalto.

  3. Zuzu bem aê, o Marco!? Eu ainda tô de ressaca… Pagodão nervoso. Só afogando as mágoas no choppinho 69 que eu herdei de você, depois que o escapamento do meu carro caiu.
    Beijo,

  4. graças à deus não tinha ninguém com um cordão felpudo cor-de-rosa, pelo menos, né? kd o alexandre aki pra se defender?? hahaha isso não é justo XD

  5. Cara porque que voce nao usa sua inteligencia com coisas mais uteis. tem muito tempo que nao veja alguem tao sem cultura igual voce. se enxerga cara, e usa sua inteligencia para coisas que edifica

  6. Cara porque que voce nao usa sua inteligencia com coisas mais uteis. tem muito tempo que nao veja alguem tao sem cultura igual voce. se enxerga cara, e usa sua inteligencia para coisas que edifica

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