Rute encontra Boaz

(Rute 2)

Onde é que estávamos? Ah, sim: começou a colheita de cevada em Israel, depois de anos de fome. Rute, sempre disposta a ajudar, foi falar com a sogra:
— Dona Noemi, eu estava aqui pensando num jeito de ajudar a senhora aqui, de botar comida dentro de casa, essas coisas.
— Ah, minha filha, que bom! Já escolheu o ponto, ou vai trabalhar em boate?
— Er… Na verdade eu estava pensando em ir catar espigas.
— Ah. C-claro, claro. Excelente idéia, Rute.
Então Rute foi para o campo e começou a andar atrás dos trabalhadores que faziam a colheita, apanhando as espigas que eles deixavam cair no chão (de acordo com a lei mosaica, o segador estava proibido de voltar atrás para pegar o que sobrava: o que caía no chão era destinado aos pobres). Rute foi indo atrás de um e de outro, e acabou entrando na propriedade de um certo Boaz. Esse Boaz, vejam só, era parente de Elimeleque, o finado esposo de Noemi. Pois bem, Rute estava naquela labuta quando o dono da plantação chegou e foi falar com os empregados:
— Que Javé esteja com vocês.
— Nah, com você.
Notando a presença tímida de Rute logo atrás de seus funcionários, Boaz perguntou ao chefe dos segadores:
— Ei. Quem é aquela moça ali?
— É a moabita que veio para cá com a Dona Noemi. Ela pediu para que eu a deixasse ir atrás da gente, catando as espigas que fossem caindo. Eu não achei nada de mais, autorizei. Ela está trabalhando desde cedo e só parou pra descansar um pouquinho na sombra.
— Hum… Rute, não é?
Sim Senhor…
— Escute, minha filha: não vá catar espigas em nenhuma outra plantação. Fique por aqui, e trabalhe perto das minhas servas, ficando com elas quando forem cortar espigas. Eu já dei ordem aos empregados para não mexerem com você, não se preocupe. E quando você sentir sede, pode beber a água que os empregados tirarem para beber.

[A partir de agora, Rute (assim como Noemi, mais tarde) passa a falar o velho e universal idioma chamado mulherês. Sabe aquele negócio de dizer uma coisa que significa o contrário, um filho do sarcasmo e sobrinho-neto da ironia? Pois então: nos próximos diálogos, transcreverei normalmente o que foi dito, e botarei entre parênteses e em itálico (a la Stephen King) o verdadeiro significado das palavras. Preparados?]

Quando Boaz terminou de falar, Rute ajoelhou-se, encostou o rosto no chão e disse:
— Por que foi que o senhor reparou em mim, e é tão bom assim para uma mera estrangeira?
(Sim, sim, quanta bondade! Podia me dar um emprego decente, ou então alguma comida, mas não! Me dá autorização para sair catando espigas caídas, como se isso já não estivesse previsto na lei de seu país. Cara-de-pau…)
Boaz não falava mulherês (nenhum homem fala), então apenas respondeu à pergunta:
— Eu ouvi falar do quanto você ajuda sua sogra, e que deixou sua família em Moabe para vir viver em Israel com ela, no meio de gente desconhecida. Que Javé a recompense, minha filha, que o Deus de Israel, que você veio procurar, te dê uma grande recompensa.
— Ah, mas assim já é demais! O senhor está sendo muito bom para mim. O senhor me dá ânimo, falando assim com tanta bondade. Eu bem sei que mereço menos do que uma de suas empregadas.
(Pelo jeito eu não mereço mesmo é nada. O negócio por aqui é na base do ‘Deus lhe pague’. Já vi tudo…)
Rute continuou trabalhando. Na hora do almoço, Boaz mandou chamá-la.
— Rute, venha aqui. Não se acanhe. Olha aí, pode comer.
Rute sentou-se entre os trabalhadores, e Boaz lhe deu cevada torrada para comer. Cevada torrada. CEVADA TORRADA! Sei não, tenho cá pra mim que cevada só presta se for assada com água e fermento, em forma de pão, ou então fermentada, como cerveja. Cevada torrada deve ter gosto de cabeça de alfinete. Mas Rute, sempre muito educada, empanturrou-se de grãos. E quando ela se levantou para voltar ao trabalho, Boaz ordenou aos empregados:
— Deixem a menina pegar espigas onde bem entender, e não mexam com ela. Aliás, deixem algumas espigas caírem de propósito, se puderem.
E assim Rute catou espigas até de tarde. Depois debulhou os grãos das espigas e os pesou: vinte e cinco quilos, nada mal para um dia de trabalho (fora a diversão que deve ser trabalhar o dia todo curvada sob o sol do Oriente Médio). Ela pegou sua cevada, assim como o que lhe sobrara do almoço (CEVADA TORRADA, MEU DEUS!), e levou tudo a Noemi. A sogra ficou espantada com a quantidade de grãos:
— Rute do céu! Onde é que você foi catar espigas hoje? Que Deus abençoe o homem que se interessou por você!
(Tomara que esse sovina pelo menos tenha o azar de engravidar você; só assim pra gente sair da merda)
— Um tal de Boaz, Dona Noemi, um homem muito bondoso.
(Filho da puta nojento…)
— Que Javé abençoe Boaz, que é bondoso tanto com os vivos como com os mortos. Rute, não sei se você sabe, mas Boaz é nosso parente próximo, e um dos responsáveis por nós.
(Filho da puta nojento…)
— Não sabia, Dona Noemi! Que maravilha! E sabe da maior? Ele disse que eu posso continuar trabalhando lá!
(Mas que bosta!)
— É bom que você vá mesmo, filha, porque se você for trabalhar na plantação de outro homem, é capaz que seja humilhada.
(Esse é parente, pelo menos tem obrigações)
Assim Rute continuou trabalhando nas plantações de Boaz até o fim da colheita da cevada e do trigo. Mas o fim da colheita não seria o fim da história de Rute e Boaz, como veremos.

23 comments

  1. Putz Marco, vc tem um dicionario “Mulheres x Portugues” para me emprestar? ou dizer onde tem para download? Se não souber, pode ao menos traduzir algumas frases para mim?
    O que elas querem dizer quando falam:
    “Se vc nao sabe por que estou brava, nao sou eu que vou dizer”
    “Vc acha que eu estou gorda?”
    “Essa roupa ficou boa em mim?”
    “o que achou do meu cabelo”
    eu nao faço a minima ideia do que responder nestes casos acima!

  2. Luciano Saul:
    A resposta para as questões é:
    a) Fica brava não. Gosto tanto de vc. (abraço)
    b)Não.
    c) Sim.
    d) Maravilhoso.
    Simples, não? Seja monossilábico. Menos chance de errar. A não ser quando ela quiser discutir a relação… Aí ph…eu.

  3. Adorei vir aqui! Muito bom o seu blog satírico-humorista!
    Onde aprendeu isso tudo, menino?
    Por acaso também fugiu de alguma igreja(que nem eu), depois de ver que as sujeiras são varridas prá debaixo do tapete?

  4. Marcos, seu ateu de uma figa, vá lá no ChickenDog ver o que vai acontecer contigo se não entregares a alma ao Senhor ! Arrepende-te enquanto é tempo, incréu ! 🙂

  5. Luciano, todas essas perguntas clássicas das mulheres significam a mesma coisa: Você me ama? Vamos ter um bebê?. Só que cuidado com a resposta: para “Estou gorda”, responda sempre um NÃO peremptório, mesmo que a moça em questão seja a Wilza Carla (nos velhos tempos).

  6. Nossa…vc tem um dom divino de passar a palavra da forma mais clara possível. Mas peca muito levando para apenas uma diversão. Espero que o Espírito Santo o constranja ao falar qualquer palavrão a partir de hoje…Abraços!!!

  7. Carinha, vou tomar a liberdade de copiar seu texto (excluíndo as observações em mulherês), para disponibilizar para a evangelização infantil! Ficou muito bom, mesmo! Sabe que tu ia ganhar um dindin muito bom, se fizesses esta tradução com vários livros da Biblia? Tem muito neguinho que lê, lê e não entende bulhufas…

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