As doze pedras comemorativas

(Josué 4)
Quando o povo terminou de atravessar o Jordão, e enquanto a água do rio ainda estava represada por sua força sobrenatural, deus foi falar com Josué:
— Ô, Josué. Foi boa essa, hein?
— Hum. Mais ou menos.
— COMO ASSIM, “MAIS OU MENOS”???
— Bah. Coisinha mais mixuruca fazer a gente atravessar um rio sem-vergonha feito o Jordão.
Mixuruca, Josué? MIXURUCA??? QUERO VER VOCÊ FAZER IGUAL! QUERO VER!
— Calma, Javé… Só um comentário.
— Pois guarde seus comentários pra você. E pára de frescura. Esse povo aí é resmungão mesmo e não se impressiona com nada. Atravessaram o Mar Vermelho a seco como se estivessem atravessando a Avenida Paulista. Povinho bunda… Mas essa travessia do Jordão aí já serviu pra eles verem que eu tô do seu lado.
— Será?
— Vai por mim, Josué. Vai dar tudo certo. Deixa de ser bunda mole, porra!
— …
— Seguinte: você vai construir um monumento para relembrar o milagre espantoso que foi a travessia do rio.
— Monumento, é? Posso chamar o Niemeyer?
— Mané Niemeyer! O cara ainda tá prestando vestibular pra arquitetura, ô! Além do mais, não temos tempo nem verba pra isso. Você vai falar para os doze líderes da tribo irem até ali onde os sacerdotes estão, no meio do rio. Cada um vai tirar uma pedra grande de lá e carregar até o acampamento, onde você construirá o monumento com as doze pedras.
— Tá bom então.
— Muito bem. Até mais.
Josué então repassou as ordens. Para mostrar serviço, ainda empilhou outras doze pedras no meio do Jordão, onde os sacerdotes esperavam pacientemente a ordem para marcharem, agüentando sobre os ombros uma arca de madeira-de-lei maciça contendo, entre outras coisas, as duas placas de pedra dos Dez Mandamentos. Tendo terminado seu gesto de puxa-saquismo explícito, Josué permitiu aos sacerdotes que concluíssem a travessia do rio. Assim que eles pisaram na margem ocidental, as águas do Jordão voltaram a correr normalmente.
Concluída — enfim! — a travessia, o povo começou sua marcha, finalmente dentro de Canaã, a Terra Prometida. Eram quarenta mil homens preparados para a guerra. O povo acampou em Gilgal, onde Josué ergueu o monumento com as doze pedras trazidas pelos líderes tribais.
A travessia aconteceu no dia dez do primeiro mês, quatro dias antes da Páscoa. Os reis amorreus e cananeus das terras a oeste do Jordão até o litoral do Mediterrâneo souberam da travessia milagrosa do rio, e ficaram com muito medo do avanço dos israelitas. Estes, por sua vez, estavam preparados para sua primeira grande conquista em Canaã, a tomada de Jericó. Mas antes precisavam cumprir um ritual um tanto constrangedor. No próximo capítulo eu conto.

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