Como criticar propriamente

Cansado de tantas críticas e ataques sem fundamento, pedi ao Walter, meu único crítico confiável, que elaborasse um Guia Para o Crítico Moderno. Ele prontamente atendeu à minha solicitação. Leiam com bastante atenção, e não se esqueçam de consultar o guia da próxima vez em que forem criticar alguém:
1. Faça uma coletânea de citações literário-filosóficas pseudo-intelectualóide-orgânicas para ilustrar sua crítica com metáforas eruditas, descoladas e inteligentes. O Google pode ser utilizado.
2. Estabeleça uma analogia entre o objeto da crítica e alguma cena de um filme cult europeu (de preferência, alemão) de 2 anos atrás que ninguém viu (e as 3 pessoas que estavam no cinema quando você foi assistir não lembram); melhor ainda se for uma cena boa, que só você achou ruim (“é a fotografia… não deviam ter utilizado Super 8 nessa cena” – claro, o jargão é fundamental!).
3. Situe o objeto de crítica no macro-contexto sócio-político-econômico nacional e internacional. Se você for de direita, diga que faz parte da perda dos grandes referenciais no contexto pós-ideológico por que passamos desde a queda do Muro de Berlim e o fim da União Soviética, representando uma tentativa de resgate dos valores humanistas abandonados com a despolarização global; se você for de esquerda, diga que faz parte da orquestração comandada pelo capital financeiro internacional, em conluio com o FMI e os Estados Unidos, em prol da subjugação dos movimentos populares questionadores do “status quo” nos países periféricos.
4. Nunca, mas nunca, em hipótese alguma, abra mão do Dicionário de Sinônimos.
5. Compare o objeto da crítica com alguma coisa que só você conhece. Além de ser cult, dá a vantagem de não poderem te questionar (pode ser uma cidade, um livro, a textura dos pêlos do seu Boxer… Qualquer coisa. O Diogo Mainardi, por exemplo, adora comparar tudo com Veneza).
6. Desqualifique pessoalmente o autor do objeto a ser criticado; nessa hora, vale tudo: dizer que ele é feio, gordo, bobo, narigudo, não pega ninguém, usa uma gravata muito feia, fede, tem mau hálito, usa um cabelo ridículo (ou não o tem), não consegue pronunciar os “S”, fala sempre uma determinada expressão, nunca faz a concordância, mora longe, come com as mãos (ou com talheres de prata, tanto faz), enfim, o importante é desqualificar o autor. Costumam ser particularmente eficazes trocadilhos com o nome (Ex.: Nicolalau, Malocci, Beto Bicha, Marta Suplício, etc.) e análises psicanalíticas da intenção subconsciente do autor (Ex.: “esse seu artigo revela uma agressividade oculta que é conseqüência de uma ausência de castração, o que causou uma fixação na fase anal e uma correspondente má-formação do superego. Em decorrência disso, percebe-se a sua permanência no estado narcísico primário e a sua dificuldade de auto-afirmação enquanto ego, enquanto sujeito, e mesmo enquanto homem, o que é reprimido e ao mesmo tempo libertado [sim, paradoxos incompreensíveis são sempre bem-vindos] por meio de ironias subliminares e sarcasmos não-intencionais).
7. Conclua com um: “Em suma…”
8. Agora é só rechear com o “isso daí tá tudo uma bosta!”, que você já estava com vontade de falar desde o começo.
Pronto! Agora você já sabe como fazer sua crítica com a graça e elegância da/do mulher/homem moderna/moderno!

22 comments

  1. Calvin: Eu detestava escrever trabalhos, mas agora gosto. Eu percebi que a finalidade de escrever é inflar idéias fracas, obscurecer raciocínio pobre e inibir a clareza. Com um pouco de prática, a redação pode ser uma névoa intimidadora e impenetrável. Que ver meu relatório do livro?
    Haroldo: “A Dinâmica do Interser e Imperativos Monológicos em Dick e Jane: Um Estudo em Modos Psíquicos Transrelacionais de Gênero”.
    Calvin: Academia, aqui vou eu!

  2. Calvin: Eu detestava escrever trabalhos, mas agora gosto. Eu percebi que a finalidade de escrever é inflar idéias fracas, obscurecer raciocínio pobre e inibir a clareza. Com um pouco de prática, a redação pode ser uma névoa intimidadora e impenetrável. Que ver meu relatório do livro?
    Haroldo: “A Dinâmica do Interser e Imperativos Monológicos em Dick e Jane: Um Estudo em Modos Psíquicos Transrelacionais de Gênero”.
    Calvin: Academia, aqui vou eu!

  3. E quanto ao modo “errado” de criticar??
    Iniciando com “Puta-que-o-pariu”
    Sempre tem um toque de inveja…do tipo “se fosse no meu blog…”
    Tem também os caras que descem o pau só pra ganhar notoriedade… Você viu o post da Alê a respeito dos viciados?
    Abração
    Fariseu!!!!
    What a fucking it mean “Father Mackenzie”?

  4. sabe de uma coisa????
    prefiro ficar com o meu velho e bom:
    VTNC, isso aquí tá uma bosta…
    É que dá menos trabalho, além do mais, é de fácil entendimento para qualquer pessoa de qualquer sexo/raça/cor/credo/posição social/profissão, etc…
    certo macacaurélio???? hahahahaha
    um abraço!!!

  5. Hah. Pelo visto estás acostumado com críticos de baixa qualidade, não é mesmo?
    Mas não repudio seu texto. Na verdade os críticos, pelo menos nos blogs, falam muita merda mesmo. Aí deixa um pré-conceito compreensível – mas nem tanto aceitável. Isso porque não faltam autores de blogs que não curtem muito ouvir quem não está disposto a apenas comentários elogiosos.
    Fazer o que?

  6. Bom Marcurélio, ‘Father Mackenzie’ ainda deixa dúvidas se é de Eleanor Rigby; muda logo pra Fool On The Hill e não se fala mais nisso – lol
    Obs. Se for de Eleanor Rigby, é ‘McKenzie’ que escreve…

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